Gezi foi devolvido à população. Ou assim diz a retórica do governo, depois da brutal operação policial dia 15 de Junho, que não poupou nada nem ninguém. Após mais um dia de violentos embates, a situação em Istambul acalmou— e a entrada no Parque Gezi está barrada pela polícia.
Enquanto a polícia montava cerco e gaseava o Hotel Divan, onde alguns manifestantes se refugiaram depois da carga policial, uma legião de trabalhadores camarários destacada para o local retirava todos os vestígios da acampada. E, imagine-se, plantava árvores, o que é bastante bizarro atendendo que a intenção do governo sempre foi desde a primeira hora demolir o parque. Para quê isto, então? Simples, tem duas razões. A primeira, para discursos internos. Dia 16 já Recep Tayyip Erdoğan batia no peito afirmando num comício em Istambul que agora os verdadeiros ecologistas estavam em acção, no tal parque libertado das forças opressoras. A segunda é mais matreira— ao plantar uma centena de árvores no relvado, retira-se efectivamente espaço para futuras acampadas. Agora para montar tantas tendas, só destruindo o que foi plantado (e que, segundo o jornal Hürriyet, inclui muita roseira, o que está bom de ver também dá mau estar ao campista)— coisa que seria bradada até à exaustão pelo Primeiro-ministro: "Estão a ver? Que tipo de ecologistas são estes que destroem árvores? São saqueadores que só querem destruir!" (este discurso não foi feito, sou eu a antever atendendo ao que tem sido a tónica das intervenções de Erdoğan).
Desde dia 16 algumas coisas mudaram. Uma dessas mudanças foi o aparecimento pontual de pequenas milícias armadas com paus e facas que, com a conivência policial, têm atacado manifestantes. A outra foi a de novas formas de protesto. Uma delas foi iniciada por Erdem Gündüz. Dia 17 de Junho Erdem dirigiu-se a Taksim, e parou frente ao Centro Cultural Atatürk. E ali ficou, parado, a olhar para uma enorme tela com o busto de Mustafa Kemal Atatürk (o fundador da Turquia moderna) que cobre parte do edifício. E ali esteve de pé, durante oito horas a fio. E assim nasceu o protesto Duran Adam (literalmente Homem Parado). Quando Erdem abandonou a praça Taksim, já uma dezena de outros manifestantes o imitavam. Perante isto, a polícia resolveu deter quem ali estava parado, a olhar para Atatürk.
Protestos silenciosos em frente ao Centro Cultural Ataürk, na Praça Taksim |
O protesto pegou, e desde então centenas de pessoas têm acorrido ao local, e ali ficam paradas, de olhos postos em Atatürk. E o protesto continua. Her Yer Taksim Her Yer Direniş (Em todos os lugares Taksim, em todos os lugares resistência). Ainda é só o começo, dizem os manifestantes.
5 comentários:
Bravo, Pef!
Obrigado pela disponibilidade e pela excelente reportagem!
Um abraço para a Turquia
Obrigada, Pef, por nos dares a conhecer o que se está a passar.
...o Duram Adan deve fazer um grande nervoso miudínho nos governantes turcos...
...bem feito...
Desde o dia em que foi notícia no P3, que tenho acompanhado esta bela reportagem. Os desenhos e descrições são sempre incríveis. Vivo também em Istanbul, mas só através da internet é que tenho acompanhado tudo o que se tem passado em Taksim. Esta tem sido a minha fonte favorita.
Bravo pelo excelente trabalho e pela coragem!
O desenho é uma verdadeira pintura. As palavras batem forte na alma dos portugueses de brandos costumes.Um abraço de Portugal, força PeF, força Turquia!
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