(antes que perguntem - não, ainda não tenho blog)
melros, pombos e uma andorinha-dos-beirais
Suponho que seja mal comum darmos connosco de suspiro fácil esgueirando garganta afora com o pensamento posto em lugares distantes, em culturas diferentes, em passarada fina exótica - bom este último exemplo alguns mais que outros. E que quando lá chegarmos é que vai ser, desenhos a torto (tordo?) e a direito, páginas e páginas de vertigem desenhadoira, um manancial de imagens que metem os mil-e-quinhentos-mega-pixéis a um canto. E esfregam-se as mãos num comportamento relíquia como quem acende fogueira com raminhos secos...
Pelo menos comigo é assim.
Isto cada um sabe de si (e Deus Nosso Senhor sabe de todos, dizem), mas depois de algumas idas lá ao tal sítio exótico e lindo e fascinante, constato que afinal não me fica assim tanto no diário. Se calhar é ser-se lambareiro, mas poucas foram as viagens em que deu para desenhar à saciedade. Ou é a companhia, ou é a falta de tempo, ou a frustração, ou o alinhamento astral que não é o mais favorável, ou sei lá o que mais. Ou a falta de preparação.
Há que manter a mão educada. Há mil e uma razões para desenhar frequentemente, pela pausa, pela cronologia, pelo registo. Manter a mão treinada é meio caminho andado para um registo satisfatório. Bom, talvez não tanto, mas lá que ajuda, ajuda.
E é com isto em mente que tenho ido quinze minutos por dia para o jardim, um qualquer. Desde que com algumas aves. A ideia é simples, familiarizar-me muito bem com o que há à mão, para que quando o que não há à mão estiver à mão não falhar a mão. Simples, não?
E neste processo de desenhar o corriqueiro aprende-se sempre tanto. Nos quinze minutos no jardim tenho observado os melros a procurar comida para as crias que silvam nos ramos acima da minha cabeça, visto o modo como os pardais rondam e se aventuram por entre os gigantescos pombos para sacar aquela migalha, como voam baixo os andorinhões se a chuva ameaça. Apanha-se isto pouco a pouco, com paciência. E a pouco e pouco vai ficando a morfologia das aves. São quinze minutos sempre muito bem empregues (que gastos são os sapatos).
E quando chegar o dia da viagem prometida, do agora é que vai ser, pois então, será.
Ou isso ou me resigno ao facto de que o sítio lá longe para o resto do mundo, o da cultura exótica e paisagens únicas, da passarada fabulosa, é aqui.
E é mesmo.
Ficha técnica
data: 25 a 27/06/2009
material: Moleskine Sketchbook 9x14; lapiseira 0.5
banda sonora: som ambiente