Nunca encontrei ninguém completamente incapaz de aprender a desenhar.

John Ruskin, intelectual inglês do século XIX


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segunda-feira, 9 de abril de 2018

Dia Nacional dos Moinhos | parte I

Desafiei os Oeste Sketchers a comemorar o Dia Nacional dos Moinhos, com um encontro de desenho em Torres Vedras. Desafio aceite, roteiro desenhado: Bordinheira, Caixeiros, Azenha de Santa Cruz. Quando saí de casa, aproveitei para treinar e começar o dia com esta paisagem, uma velha conhecida, toda ela marcada por moinhos tradicionais e industriais (energia eólica).
Aproveito para agradecer aos coordenadores (Ana Ramos, Pedro Alves e Bruno Vieira), por esta resposta, mas sobretudo pelo excelente trabalho que têm desenvolvido.
 

Junto às Estação de Serviço BP Casalinhos de Alfaiata. 

10h - os desenhadores vão chegando. Algumas desistências devido à chuva, mas tivemos umas estreias no grupo, a Susana Coelho membro do grupo Évora Sketchers e uma estreia absoluta no desenho, a Carla Inácio de Torres Vedras.
 O primeiro a chegar foi o Sr. Joaquim Constantino, mais conhecido por Quim, moleiro e nosso anfitrião. A sua casa fica junto ao moinho e por baixo da casa, fica a moagem. O quotidiano deste moleiro  divide-se essencialmente por estes três espaços. O seu patrão é o vento, pois é ele quem lhe dá ordens e sustento. Apesar de hoje ter a sua moagem mecanizada, o moinho continuar a moer cereais. A sua produção divide-se entre o artesanal e o industrial. O que não se divide é a qualidade - única e de excelência.  O Sr. Joaquim é a terceira geração de moleiros, tudo começou com o seu avô, ainda no séc. XIX, com o Moinho Frade, que actualmente pertence a uma prima. O seu pai continuou com a profissão e no ano de 1946 construi o segundo moinho do Casal do Moinho Frade, o "Moinho do Constantino".
Sábado costuma ser um dia agitado, mas a generosidade do Sr. Joaquim levou-o a reservar a manhã para nós. Soltou as velas, mas não as largou, devido ao vento e chuva. Apenas para a fotografia... ou melhor, apenas para o desenho.
 

A chuva demorou a chegar, até por que "ela anda ali mais para o lado da Freiria. Lá está negro, eles andam a rezar pouco", rematava assim o sr. Joaquim com a sua gargalhada que tão bem o caracteriza. Aproveitei para fazer mais um desenho.

 
Afinal não é só na Freiria que se reza pouco, na Bordinheira também. A chuva chegou, mas em forma de aguaceiros rápidos. Os moinhos e a moagem transformaram-se em abrigos. O excelente estado de conservação em que se encontram, conferiram todo o conforto necessário para uma boa manhã de desenho. As abertas eram aproveitadas por alguns. Outros transformaram a moagem num verdadeiro atelier, e ainda houve quem preferisse o automóvel.
 


E outros, como eu, aproveitaram para saber o que é "habitar" um moinho. Instalei-me no 3º piso, junto ao capelo. O som da chuva a bater no capelo é música para os ouvidos. A visão perde-se perante tantos pormenores - madeira, pedra, metal, cordas... Tanto para desenhar, tanto para Ver.  Um lugar mágico por um lado, mas por outro lado leva-nos a imaginar a vida dura que os moleiros tinham.
 
 


No final, lancei o desafio de deixarmos com o Sr. Joaquim uma lembrança da nossa passagem. Pegar numa saca de farinha nova e personaliza-la com um desenho de cada desenhador. Aceite e superado.
 

 
No momento da habitual partilha e foto de grupo, tivemos o privilégio de conhecer o moleiro mais antigo da freguesia da Ventosa, o Sr. Benedito Ferreira Carinho, que este ano celebrará 90 anos de vida, quase toda dedicada aos moinhos. Nunca teve outra profissão, foi amor para a toda a vida e isso percebe-se no brilho dos olhos, quando fala sobre os moinhos e os moleiros. Imaginem só as histórias que ele tem para contar. Combinámos um encontro, para conhecer o seu velhinho moinho do Cortiço, mas sobretudo para ouvir as histórias que tem para partilhar. 

 O seu moinho, localizado em Bonabal, está abandonado desde a década de 1970, quando "uma espécie de tufão passou por lá e levou o capelo. Foi uma dor de alma, um dos dias mais tristes da minha vida, nem sabia o que fazer. Mas fiz-me ao caminho e construí uma pequena moagem e continuei a trabalhar até não poder mais. Hoje é o meu filho que segue com o negócio, mas o moinho nunca mais foi recuperado, continua lá em ruína, é uma tristeza. Mas custa muito dinheiro arranjar aquilo..." (Sr. Benedito)
 
 



 
 
 
  Foto de grupo com os nossos anfitriães.



 


5 comentários:

Ana Ramos disse...

Muito bom André. Nós é que agradecemos o teu empenho e dedicação na organização de eventos de alta qualidade.
São sempre bons e revigorantes.
De excelência. Muito obrigada e parabéns.

Urban Sketchers Portugal disse...

Não conhecia a tua faceta de desenhar pessoas. Boa!

hfm disse...

Tive pena de não poder estar em doi Abraço.s sítios ao mesmo tempo.
Os desenhos estão óptimos.

Teresa Ruivo disse...

Não conhecia a tua faceta de desenhar pessoas. Boa!

Pedro Alves disse...

Bela reportagem, estás a ficar um fantástico contador de histórias desenhadas! Quando fizer o meu post não conseguirei acrescentar nada que não tenhas dito (ou que venhas ainda a dizer...)